quarta-feira, 18 de novembro de 2009

O pão que o diabo amassou.


Receita de pão que o diabo amassou.

Ingredientes:
15 quilos de mistura de farinha preparada para pão.
1 quilo de açúcar cristal.
500 gramas de margarina vegetal.
500 gramas de fermento biológico.
5 litros de água potável.

Rendimento:
380 a 400 pães.

Modo de preparo:
Colocar a mistura de farinha dentro da masseira, ir adicionando água aos poucos até formar uma liga. Adicionar o açúcar, colocando simultaneamente a água. Em seguida, misturar a margarina à massa e, por fim, adicionar o fermento biológico. Deixar misturar dentro da máquina para que a massa fique totalmente homogênea.
Logo na seqüência, retirar toda a massa e cortá-la em postas de aproximadamente 2,5 quilos. Passar pelo cilindro industrial cada pedaço vagarosamente por cinco vezes, observando sempre a consistência da massa.
Em seguida colocar os pedaços na prensa de separação, onde cada pão irá adquirir peso e formato ideal, antes de passar novamente pelo cilindro e finalmente serem acomodados nas bandejas para repouso. Nesta fase os pães serão separados uns dos outros e armazenados nas esteiras de uma estufa elétrica, onde ficarão por aproximadamente 40 minutos em repouso sazonal, em temperatura controlada em exatos 40º C.
Terminado o processo de preparação da massa, os pães são espaçados uns dos outros dentro da bandeja e encaminhados ao forno à lenha, onde serão assados por 20 minutos a uma temperatura de 170º C.

O processo:
Quatro são os envolvidos no processo de produção; cada qual com sua função específica, contudo todos a par de todas as etapas de produção. A interação é dinâmica, o entrosamento é total, o processo de liderança é dividido de acordo com as funções.
A disciplina impera, o controle de qualidade é rígido, a dedicação é exclusiva – a demanda é alta e o tempo escasso - logo as perdas durante o processo são logo superadas.

O produto final:
São 2500 pães diários; sendo 250 para consumo funcional diário da unidade; outros 250 para funcionários das demais. 500 para consumo da população carcerária local e outros 1000 para as outras e o restante fica estocado para emergências.

Receita de pão que as circunstâncias amassaram.

Ingredientes:
1 latrocida.
1 assaltante de joalherias e carros-forte.
1 traficante de pasta-base de cocaína e todos os seus sub-produtos.
1 ladrão* (Extensa ficha criminal).

Modo de preparo:
Pegue a falta de oportunidade; de acessos a recursos básicos; junte tudo isso a uma educação familiar desestruturada, violência e injustiças e têm-se a base da preparação. Misture tudo com o oportunismo; ganhos fáceis em curto tempo, adicione motivos intrínsecos de falta de caráter,sentimento de inferioridade, revolta e ganancia e covardia.
Misture tudo até transformar numa massa densa e concentrada, de difícil desvencilhamento ao entrar em contato. Deixe-a fermentar livremente, crescendo desordenadamente. Separe-a da sua realidade; ignore-a e a jogue dentro de uma panela de pressão e deixe cozinhar até que exploda e espalhe por todos os cantos e, respingue em você, mesmo que indiretamente.

O processo:
Juntos, os quatro envolvidos acumulam mais de 150 anos de condenação. Todos reincidentes; nenhum com menos de trinta anos de idade – contrariando as estatísticas. Unidos por uma única causa - a sua própria remissão de pena, a chance de encurtar sua estadia intra-muros. São habilidosos e ardilosos ao mesmo tempo. Ágeis com as mãos e com os olhares, passam o tempo concentrados no ofício de padeiro e nos meus movimentos.

O resultado final:
Os pães são de primeiríssima qualidade; feitos com aparente cuidado, interesses diversos e muita sede de liberdade. Eu provo o produto sempre e o resultado é sempre satisfatório; diferentemente da segunda receita, que por mais dedicação e qualidade do material, o produto final é sempre rejeitado, não passa pelo controle de qualidade e volta para a panela de pressão novamente.
Serão sempre bem-vindos...

(...) Aprendi a fazer pão no meu trabalho, apesar de não ser padeiro e não estar numa padaria convencional - mas foi um dia divertido, ou melhor, produtivo. Afinal de contas, quem está comendo o pão que o diabo amassou: nós ou eles?

Um comentário:

  1. Eis o pão nosso de cada dia; que tão sagrado fôra um dia!
    Já não nos permite definir se o pão que o diabo
    amassou ficou aqui fóra ou foi aí pra dentro!
    Pq. na realidade, aqui falta pão!E como faz falta um pão; que seja um pão!

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