Já
flertamos algumas vezes, de fato - mas nada tão agressivo quanto agora; porque
não me levou? Porque me bateu tanto, me fez sentir falta de ar, sede, fez cada
nervo do meu corpo se contrair de uma forma tão violenta que deixaram hematomas,
tonturas, calafrios e hipertermia. E como num looping, me fez retornar ao ponto
zero novamente.
Cá
estou, vivo.
Estava
inerte na cama, já não sentia o lado direito do corpo; tudo formigava, estava
chegando a hora - pensava.
Senti
uma sede sem fim, mas ao mesmo tempo meu corpo dizia para não beber água pois
iria engasgar; perdi o controle dos meus olhos, dos lábios; já não via mais
nada, não fazia sinapse, lutava para manter uma respiração continua e
prolongada; não queria um último suspiro e pelo visto nem VOCÊ.
Eu
implorei pela minha vida, VOCÊ quis isso. Eu pedi por ela, tamanho era o medo
que senti. Eu senti desespero, balbuciava: não, não, não quero morrer.
Comecei
a juntar todos fragmentos de conhecimento sobre vida e morte que havia
assimilado durante a minha existência: um dos últimos sinais de vida é sentir
sede; frio e pedir perdão.
Pressionei
minha língua com força contra o assoalho da boca para não contrair e me
asfixiar; tentei me manter na mesma posição. Queria pedir perdão para tantas
pessoas, mas nenhuma estava próxima, então pedi para a que estava por perto, por
fazê-lo presenciar seu melhor amigo ter uma intoxicação por tudo quando é tipo
de dor e ficar no limiar entre a vida e a morte.
Fez-me
sentir medo, pedir ajuda, recolher-me à minha insignificância diante da
vastidão da vida. Meu coração batia tão forte, mas tão forte que era visível as
suas contrações, meu peito enrubescia e escurecia conforme as contrações;
ficara vermelho escuro, quisera explodir, sair tudo para fora; musculatura,
pleura, pulmão, artérias e veias e sangue, muito sangue.
Não
as contava, apenas aspirava que parasse logo, que meu olhos se revirando centralizassem,
a sudorese evaporasse, meu corpo silenciasse e finalmente eu pudesse descansar.
Senti uma miscelânea de sensações físicas que nunca senti.
Nestes
instantes para me desvencilhar da dor, do desespero e do incerto; pensava em
como seria esta transição corpo x espírito; será que alguém iria me buscar ou
se simplesmente fecharia os olhos, escureceria tudo e era chegado fim.
Fiquei
esperando alguém me buscar pela mão de verdade, mas ninguém veio.
Nem
para cima, nem para baixo. Nem de branco, nem de preto.
O
que estava querendo me dizer? Qual era a mensagem? Era que, a hora que você
quisesse, eu seria um sopro, um estalo de dedos, um grão de poeira?
Seu
esforço parece ser contraproducente. Quanto mais me precavê e me alerta; mais
longe tento ir.
As
crises estão se tornando mais intensas; mas não desistimos. Eu, indo no meu
limite, VOCÊ tentando mostrar que a tendência não é sobreviver, mas sim viver.
Fui
me recuperando aos poucos; quando pensei em desistir; quando o ar me faltava,
os olhos reviravam, os lábios pretejavam, minha boca estava estática com a
glote seca; contrações involuntárias e violentas; veio um silencio sepulcral.
Sabia
que não tinha morrido, meus braços se estiraram na cama, já movia o pescoço,
engolia lentamente saliva, a dor passara - meu amigo comemorava, pedia eu para
aguentar o socorro.
Aos
poucos me restabeleci; sem tomar nada, nenhuma ajuda profissional, meu corpo
estabelecia a homeostase. Do nada, simples assim, contra todos os prognósticos.
Por nada. Eu não entendi. Era para eu ter morrido, apesar do medo, estava
pronto para isso.
Enquanto
me recuperava na ambulância, já respondia todas as perguntas do técnico;
aceitava calado os conselhos e broncas, apenas olhando fixamente numa janela
fechada do carro. Tinha sinais vitais estáveis, apenas o raciocínio lento. Eu
me sentia fraco, envergonhado, culpado, assustado.
Infelizmente
as minhas perguntas ficaram sem resposta; passei por uma avaliação criteriosa; Técnicos
de hospitais se comunicavam gritando: o nome do paciente sempre associado ao que eu havia
tomado ou feito. “Fulano que caiu da moto”; “Senhora da pressão”; Fabiano da overdose.
Porque
não me leva; seja com dor, sem dor, sofrimento – qual a parte que isso aqui
nunca me apeteceu, ainda não assimilou? Desde os meus tenros oito anos de idade
quando sentia aquelas dores insuportáveis daquela doença autoimune mutilante
que eu não queria fazer parte disso daqui.
Eu
nunca gostei desse lugar, sempre te falei em pensamento. Isso não é para mim,
porque eu tenho que passar por tudo isso? Mas ao mesmo tempo eu não consigo por
si só por um fim nisso; tenho todas as ferramentas, mas isso não é meu mister.
É seu porra!
Só
me leva cara. Me leva, porque eu não vou fazer isso diretamente, doa o que
doer, mas você vai me levar, porque eu não aguento mais isso que escreveu para
mim.
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