domingo, 12 de julho de 2009

Você é aquilo que você SUJA.



A minha lavadeira me conhece – ela sim sabe o que realmente se passa comigo. Sabe dos meus passos como ninguém; é a quem confidencio silenciosamente os meus dias, sem nenhum pudor, mantemos uma empatia cliente/prestador de serviços; entendemo-nos apenas no olhar profissional dela e mantém-se sempre uma discreta confiança, mesmo com toda sua peculiar efusividade.

Avalia-me, obviamente pela roupa suja que levo à ela - e não pelas horas de conversa que dispersamos descompromissadamente quando dos finais de tarde - ela sim sabe dos meus problemas ou a falta deles, mesmo sem eu contar.

Sabe se/com quem ando; relaciono; alimento e qual meu estado de espírito.

A quantidade exagerada de roupas de frio suja indica que esteja provalmente com a resistência baixa e que evito usar por muito tempo a mesma vestimenta. Fruto de excesso de trabalho. Mas o que leva o excesso de trabalho, a troca de plantões sem ter a devida necessidade?

Para maiores conclusões analisa as camisetas: se são mais as coloridas ou apenas as brancas (que uso por baixo do colete ou as negras - já próprias para o trabalho). que estão em maior quantidade.

Verifica se há cheiro de cigarro impregnado nas coloridas e, se sim – conclui pelo excesso de álcool. Seguindo a mesma linha de raciocínio analisa as meias; realmente as troco com freqüência diária quando pelo excesso de trabalho - dado o acúmulo de água no tênis ou no coturno, quando em tempo de chuva e, logo ligando tudo à troca excessiva de roupa de frio.

Mas ela é minuciosa, nada passa despercebido ao seu crivo investigativo. Não basta saber o que fiz ou deixei de fazer - há uma necessidade incessante de saber os porquês dos meus (des)feitos.

- Seria uma fuga ou necessidade? - questionaria-se. Pense, vamos pense D. Maria, há mais peças a serem analisadas ou mais detalhes embutidos nas mesmas peças.

Após uma triagem inicial, depois de traçar superficialmente como estou fisicamente, quer saber o porquê de eu trabalhar tanto ou beber na mesma intensidade - o porquê de eu não sair mais com a loira e encontrar a morena nos fins de semana. Quer mais detalhes e os procura revirando a sacola de roupas e analisando cada peça com suas próprias mãos, observando a ordem com que foram colocadas no cesto para saber a seqüência correta dos acontecimentos.

Procura, então, por manchas de alimentos, para poder concluir se estou realmente trabalhando por necessidade ou fuga. Roupas com respingos de alimentos - geralmente fast-food, confirmam a teoria de que o trabalho é necessário e fora assumido por motivos de força maior - fato este que é comprovado pela falta de tempo para alimentar-me de forma regrada. E que, apesar de desregrada, conclui-se que estou me alimentando, logo não é propriamente um desleixo com a saúde e sim uma necessidade temporária. Logo, aparentemente estou bem. Só sem tempo e a falta de alimentação, somada à rotina extenuante, contribuíram para baixar a minha resistência física.

Mas a falta de manchas diz que algo não vai bem, de que não estou saindo de casa para nada ou que não estou me alimentando de nem de junkie-food; logo parte para uma análise aromática - técnica aprimorada há anos de convivência.

Sabe meus perfumes, quais os preferidos e em quais dias da semana os uso e nas suas devidas ocasiões, pois tem meu perfil já traçado, basta ligar os pontos. São dois anos de estudo, de convívio indireto com a minha roupa suja.

Perfumes misturados indicam envolvimento; mas como definir se eu estava numa boate, bar esbarrando numa pessoa ou se estava à sós com alguma mulher?

Tão elementar para minha experiente colaboradora.

Analisa pelas mangas – geralmente quando há vários aromas diferentes é sinal de contato físico não intencional e constante com várias pessoas. Para fechar com chave de ouro sua linha de pensamento, analisa a gola e a parte do tórax da camisa. Vê se não há puxões, alargamento excessivo, leva mais perto do nariz para tentar identificar se meu perfume está apenas misturado com cheiro de cigarro ou tem outro embebido no tecido.

Se não bastasse, ainda de forma não intencional, decifra a personalidade ou o apetite da pessoa com quem estive. Analisa se há cabelos - e se os há, quais as cores; verifica pacientemente se há excesso de brilho, maquiagem - o que levaria a pensar que se trata de um encontro casual, num local público e não fora programado por mim.

Para realmente dar o veredito se foi exatamente esta pessoa com que me encontrei, pega as calças e compara com as camisas de forma sistemática – utilizando-se do mesmo processo. Sabe quem tocou mais quem pelo cheiro que fica sob meus bolsos, pois na maioria das vezes eu apoio muito a mão sobre os mesmos e, tratando-se da parte que toma mais a iniciativa, estes estariam com o mesmo cheiro.

Analítica D. Maria - contundente e perfeccionista quando refere-se a mim.

- Como terminara este episódio, pois vejo aqui mais outras e muitas outras peças, teve uma semana agitada, apesar do excesso de trabalho? - preciso decifrá-lo, preciso! Incansável, D. Maria.

Os bolsos, então checa-os, como tato e olfato. Geralmente acha papéis, muitos papeis – recibos de cartões de débito e recarga de celular - nem olha o valor, apenas o local em que fora gasto e já sabe se foi bom ou ruim a noite ou o dia; se estive só ou com amigos da faculdade, se foi um encontro ou apenas uma reunião de colega de trabalhos. Cheira-os também, para saber se sente cheiro de borracha de preservativo, halls preto ou qualquer outro apetrecho que indique que eu sai intencionado.

- Roupas de cama? Sim, mas seria muito obvio analisar agora. - pensou, com olhar desafiador.

Mas não é sua especialidade e nem o seu interesse a minha vida financeira – apesar de influir diretamente na demanda e no objetivo final do seu trabalho; pois sim, eu gasto uma quantia relativamente substancial por mês com as roupas sujas e, invariavelmente, quando estou feliz gasto mais ainda.

Revira o fundo das sacolas e como sempre acha muitas toalhas, como sempre - significa que ainda tenho algum tipo de transtorno obsessivo, pois mesmo no inverno, verão – praticando ou não esportes, a demanda por toalhas é grande e quando é dobrada é porque tem saído com extrema freqüência de casa.

Mas o que o define mesmo são as roupas de cama. Se mando pouco é sinal de que depressão e conseqüentemente muito sono - sinal de fuga; percebe-se, também pela quantidade de manchas na fronha do travesseiro. Geralmente quando dorme-se muito, com sono pesado a tendência é realmente babar e quando se come na cama, os travesseiros deixam marcas deléveis...

As pontas do lençol mais sujas do que a parte de baixo, significa muita pressa e pouca preocupação com assiduidade; juntamente com restos de alimentos no lençol, geralmente manchas de bebidas sempre no mesmo local é sinal de que sai pouco da cama, não se movimenta muito.

E assim decifra o estado de espírito naquele momento.

Seguindo as mesmas premissas; seu feeling; uma lógica minha e a rotina ela sabe exatamente tudo o que fiz e, dependendo da freqüência com que levo, sabe até quais roupas serão levadas na próxima visita à lavanderia.

Quando vou buscar a roupa de cama, sempre pergunto se ficou pronta, mesmo sabendo que ficou; pego a nota; fazemos piadas sobre situações financeiras e ela me entrega a sacola com tudo limpo, nos despedimos cordialmente como velhos amigos, viro as costas e ela provavelmente guarda a conclusão para si. Sinto muitas vezes que ela se diverte com isso; somente uma vez deixou escapar, foi um deslize pequeno, mas eu estava atento ao comentário sutil que fez sobre minha semana.

Poucos shorts, pelo visto não praticou exercícios esta semana, porque esteve gripado e bebeu muita bebida destilada, porém não passou mal. Teve um encontro com uma pessoa apenas, era morena, cabelos até o ombro e extrovertida, foi um encontro marcado, porém apenas uma vez nesta semana; faltou na faculdade um dia, justamente no dia em que não dormiu em casa; tem se alimentado mal; mas pelo visto não está deprimido. Tem usado muito o celular, deve estar se sentindo sozinho, pois a quantidade de recibos de recarga é grande; sua vida sexual anda estável, pelo visto com a mesma pessoa, não a do encontro; trocou a marca de molho de tomate, pois esta remove mais fácil; tem dirigido muito e andado pouco; pois vejo marcas de sinto de segurança nas camisetas mais sensíveis e não vejo as me marca esportiva. Anda prudente no transito e tem lavado o carro com freqüência, pois as barras das calças não estão sujas. No trabalho sido escalado demais dentro das galerias do presídio, devido ao cheiro de mofo; comprou uma caixa de halls de morango e dormiu sozinho todas as noites, tirando a que não dormiu em casa.


- Quanto ficou tudo D. Maria? Até a próxima semana ou quem sabe ainda volto no final desta, com mais novidades - digo, mais roupa suja!


(Andei ausente daqui [mundo virtual]; mas não foi pela falta de "roupa suja", pois o cesto está cheio novamente; mas sim pelo ócio improdutivo que fui tomado nas minhas nada programadas férias, porém merecidas férias; só precisava mesmo do meu teclado, meu monitor, minha cadeira e das minhas roupas de cama para me inspirar novamente...)

3 comentários:

  1. Quando eu crescer quero escrever que nem ocê!
    Amocê!

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  2. "Lava roupa todo dia, que agonia..."
    rs
    Adoro!
    Bjs

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  3. Nossa Baby!Acho que voltou com novidades, digo com roupas sujas pra D. Maria mais rápido do que ela pensava. rsrs

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