segunda-feira, 28 de junho de 2010

Com todas as minhas vírgulas.


De: R.M.F.
Enviada: quinta-feira, 28 de julho de 2005 15:53:22
PARA: F.P.L.

Ontem à noite no meio da cozinha, enrolada numa toalha, cabelos molhados ao telefone, e vem você pedir pra eu repetir o que tinha dito. E eu repeti. Aí você pediu pra eu dizer de novo, e eu disse. Disse que queria te ver. Se isso não for motivo pra gente nascer, já não entendo mais nada desse mundo.

Eu preciso disfarçar que não sou louca, mas aí eu olho para você e te vejo em devaneios. Tardes pontuadas por diálogos insanos, palavras nonsense, teorias surreais. Então eu me lembro que preciso me preservar, não me envolver, juntar os meus grãos para que somente eu possa desfrutá-los.

Tenho medo de furacões que passam arrancando partes de mim, e das pessoas que passam arrancando partes de mim. Aprendi a nunca mais confundir sexo e paixão com amor e escravidão. Mas, ao mesmo tempo, não posso ser uma mulher pela metade. Tenho tanto amor dentro de mim, tanta emoção, tanto entusiasmo, que mesmo sendo inteira quase já não cabe. Vaza, transborda do meu corpo.

Sabe o que é? Muitas pessoas pisaram sem dó no meu sorriso e eu acabei ficando muito tempo sem sorrir, ou sorrindo meios sorrisos. Nada mais medíocre. Mas, felizmente, posso dizer que, apesar da minha atração pelo choro (e eu nunca sei se choro de tristeza profunda ou de contentamento desmedido, o que pra mim dá na mesma, porque os dois estados me libertam), aprendi a rir, a gargalhar e a mostrar meus dentes. Hoje eu adoro morrer de rir, adoro sentir aqueles segundos de eternidade que tanto assustam os corações acostumados com a fugacidade dos sentimentos superficiais.

Adoro me sentir como agora, com borboletas doidas e enlouquecidas no estômago. Adoro ver minha alma clarear ouvindo as músicas mais legais do mundo, escrevendo um livro ou simplesmente pensando em mim. Adoro mais ainda seus olhos pequenos, caídos para o lado, e a sua pinta que diz oi pra minha sempre que nos beijamos.

Quando nos encontramos no País das Maravilhas, me senti estranha. Você me reconheceu logo de cara, e eu me assustei porque eu também te reconheci logo de cara. Tudo isso merecia ser selado. Ontem, enquanto tomávamos chá e quebrávamos xícaras, travestidos de Chapeleiro Louco e Alice, eu me senti feliz. Você pôs a mão na minha coxa, mas não era uma mão enterrada dentro de mim, me sufocando de vulgaridades. Também não era uma mão morta de intenções. Eram apenas mãos com intenções.

E eu continuo com meus olhos brilhando, grandes, delirantes. Continuo com minha imaginação cheia de canais loucos zapeados por segundos de desejos. Dedico cada minuto do meu dia em te digerir, e quando não sei mais o que fazer penso em dormir no macio, à sombra da sua incógnita. Se isso não for motivo pra gente nascer, realmente não entendo mais nada desse mundo...

Um comentário:

  1. Belíssimo ....vale pra vida inteira.
    Se isso não for motivo para continuarem vivos pela vida inteira, não entendo mais nada nesse mundo!

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