segunda-feira, 27 de abril de 2009

Con gas.




Sabe o que eu mais gosto em você? É o fato de eu poder ser o que quiser ao seu lado, incorporar a personagem que eu quiser, que no final você sempre vai tirar minha máscara, me puxar pra perto e escancarar minha essência. Eu posso ser uma daquelas mulheres pudicas e sonhadoras que tanto me irritam, com suas heranças repressoras passadas de geração para geração; posso fazer amor com você e posso simplesmente transar com você; posso reclinar o banco do seu carro e te abraçar com as minhas pernas, de um jeito louco, suado e cheio de desejo; posso andar de mãos dadas com você; posso te contar meus segredos de lesbian chic; posso ser sua sem deixar de ser minha. E tudo isso sem o mínimo de culpa, constrangimento ou qualquer outro sentimento menor.

Em todos os lugares. Eu me digo baixinho que você está em todos os lugares. Você se enfia comigo embaixo do meu edredom, sente meu corpo quente e dorme ao meu lado até o relógio despertar no outro dia. Durante a tarde, se senta ao meu lado no trabalho e sem cerimônia usa a minha mesa e o meu micro, visita sites estranhos de pessoas estranhas e me faz sentir uma dorzinha no peito, que nem os cientistas conseguiram desvendar. À noite, você aparece no banheiro, invade o box, usa meu xampú e minha toalha. E é nessa hora que eu preciso abafar meus gritos, gemidos e sussurros para que ninguém nos ouça. Depois, você senta na minha cama, liga o som e separa minha roupa, me ajuda a escolher a maquiagem, seca o meu cabelo e beija o espelho antes de sair.

Você não me faz sentir mais uma, o que é ótimo, porque eu odeio ser mais uma. Eu te respiro o tempo todo, fico te digerindo por horas, sentindo você dentro de mim e me lembrando da véspera. Confesso que já deu tempo de eu me cansar, chutar o balde a sair andando atrás de novas sensações, mas, por algum motivo, que os cientistas também não explicam, não consigo mover meus pés. Acho que é porque você é muito grande pra mim, seu charme é muito grande pra mim, e eu ainda não encerrei todo o meu desejo por você.

Sabe, ter alguma idade, alguma consciência e um pouco de experiência me transformou em alguém exigente e racional. Não me contento com pouco, migalhas não me satisfazem, nem nada pela metade. Odeio mediocridade. Você diz que me escolheu, mas, na verdade, fui eu quem te escolhi. Deixei você entrar, fui receptiva, ofereci chá. E você foi ficando, ficando...E a duração da sua estadia está intimamente ligada à palavra "enquanto": enquanto eu sorrir, enquanto eu ver minha alma clarear, enquanto eu sentir minhas pernas tremerem a cada gesto seu e a cada movimento dos seus olhos.

Quero você, do nosso jeito.

(R.M.F.; 09/09/2005)


(E-mail direcionado a mim; há um tempo atrás, sob o título de “Ensaio Sobre a Paixão”; Era sobre isso que tentava falar antes - em situações em que não há explicação. Remexer em caixa de e-mails antigos nos proporciona sensações estranhas, nas quais poucas tento reviver somente aqui. Façam por merecer, também!




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