sexta-feira, 5 de junho de 2009

O que não tem remédio, remediado está!




Há tempos não me divertia tanto numa farmácia como neste dia. Desde quando consegui me desvencilhar dos meus hábitos de auto-medicação - oriundos de crises intermináveis de hipocondria - nunca mais precisei utilizar um cesto para colocar as compras na farmácia; bastava colocá-las na palma da mão, carregá-las e paga-las junto ao caixa.

Pois bem, chegou o frio e com ele as suas conseqüências são visíveis na minha saúde; mesmo com a vida regrada, careta e saudável que levo hoje – durmo cedo, ando agasalhado, não bebo, nunca fumei, não faço parte de grupo de risco - aliás não faço parte de grupo algum no momento – minha resistência baixou de forma brusca.

Voltando da faculdade, pensei em dirigir-me até o centro para encontrar uma mega-store, com milhares de oportunidades e princípios ativos diferentes; mas vejo duas farmácias de médio porte, numa avenida movimenta, de um bairro legal – um dos mais tranqüilos da fronteira - resolvo desacelerar, observar as fachadas, as prateleiras rapidamente para me decidir em qual parar.

- É essa aqui, tem um nome legal e não tem muitas pessoas, vou poder passar o tempo que quiser. - conclui. Entro e ouço um rebuliço de funcionários discutindo sobre escalas de plantão, horários...- Ótimo, ninguém para me perguntar: posso ajudá-lo? - pensei.

Andei pela sessão de cosméticos, mas há.. - não perco muito tempo. Os dos supermercados são mais baratos e a variedade é bem maior. Passo apressado pela sessão de fraldas, fico olhando a infinidade de modelos, tamanhos, abas, e quantidade de tipos de xixi que podem ser produzidos, incrível! E os absorventes então?! Haja tipos de (…) ...pensaram que eu escreveria? Se pensou em fluxo, errou.

- Será que já definiram quem vai trabalhar no final de semana? - pensei, pois preciso ir nos balcões de medicamentos que teoricamente necessitam de receitas e porque está frio, quero ir logo para casa. Preciso descansar e estar bem preparado para não fazer absolutamente nada na minha sexta-feira antes do meio-dia.

Interrompo a discussão sutilmente com um: - Com licença; e lançando um olhar certeiro e demorado para o crachá do vendedor; fixando os olhos na frase “atendente” e olhando nos olhos dele, repetidamente.

- Trabalha aqui? - pergunto com cinismo, ironia e impaciência. - É, mas você já tirou folga aos sábados, agora vai ter que cobrir fulano...- Grita e gesticula o vendedor com outros dois do lado da caixa, ignorando temporariamente minha.

- Sim senhor, em que posso ajudá-lo? - diz, depois como num piscar de olhos se transforma em atendente de rede de farmácias, com todas as honras e méritos; estufa o peito, ajeita a camisa, arruma o crachá e sorri discretamente.

Então... - digo e vou andando em direção ao balcão de atendimento. - Preciso daquela pomada para passar nos meus lábios, estão prestes a estourar bolhas, pois o frio baixou minha resistência e está ardendo. Quero Aciclovir... - defini.

- Deixe-me ver as lesões... - disse todo atencioso o pseudo-médico. Virei o rosto de bate-pronto e disse: - Traga-me aquela da Medley, não tente me enganar com outras porque sei que ainda não lançaram nada de novo no mercado. - falei, deixando bem claro que tenho longa experiencia em bulas de remédios.

- Tenho esta aqui, olha... - mostrou-me uma genérica. - Hum, deixe-me ver...passe ela no código de barras, - pedi educadamente. - “Pip”: apareceram vários dígitos... - Cara, traga-me a da Medley, que tal? - eu saio feliz e você pode ir lá porque quanto mais você demorar, vai ficar sem ter como escolher os horários das escalas de final de semana. - disse rindo e pensando no bem comum da humanidade.

- Cara, em partes você tem razão, mas para falar a verdade, a contar pelo seu entusiasmo, acho que não vou sair perdendo ficando aqui vendendo remédios por quilo para você! Estou precisando de comissão e a outra marca de pomada me paga bem mais se eu a indicar. - disse-me com extrema sinceridade.

- Pela sua sinceridade eu vou...- interrompeu-me rapidamente antes de concluir dizendo: - Vai levar a outra né? - empolgou-se! - Não meu amigo, quero a da Medley, mas em compensação vou levar não uma, mas duas manteigas-de-cacau; quero as melhores marcas esta bem, não me importo com o preço. - disse com o diabinho já no meu ombro sorrindo. - Há, tem alguma novidade neste setor caro vendedor? Inventaram em spray? Ou algo mais líquido e que não congele? - perguntei. - Então, chegou em formato de bastões roll-on. - disse, cabisbaixo.
- E presta? - perguntei; até porque nunca tinha ouvido falar. - Não cara, ele seca rápido, uma bosta. - Sinceridade on!? - pensei, um vendedor honesto!

- Quanto custa? - perguntei. Ele sorriu e disse: - Cara, já perdi as folgas do fim-de-semana, você vai levar a tradicional mesmo, que é mais cara sim, mas pelo menos funciona! - concluiu. - Está bem, não precisa ficar nervoso, meu amigo, vou levar, não se preocupe. - acalmei-o.

- E o que mais você precisa? - já sem tanto entusiasmo, perguntou. - Cara hoje é seu dia de sorte, preciso daquele polivitamínico, aquele caro pra caralho, o...o... Esqueci o nome, agora ele vai me pegar! - pensei! - Há, o com vitamina “B”, concentrada. - expliquei.
- Vitamina o que? “D”? - Confundiu-se o vendedor!
- Não, colega, vitamina “B”; “B” de @#$%¨& e olhei suspirando para a - digamos saliente atendente de caixa. - Há sim, “B” de (…), entendi. Engraçado, mas geralmente não costumam fazer este tipo de comentário da minha esposa, ainda mais na minha frente... - afirmou falando sério. Fiquei pálido, branco e totalmente sem graça, sem saber onde enfiar a cara.

Tentei consertar: - Então, pensando bem vou levar o dobro de tudo, pode por os mais caros está bem amigo, é até melhor, estas marcas nacionais geralmente não tem a mesma eficácia e para não pairar dúvidas sobre o tipo de vitamina, coloque de A a Z...- disse engolindo seco e sem saber como sair daquela saia justa.

- Hahahahhahahahahhhahahahahaha. - Gargalhou o filho-da-puta! - Relaxa, vamos lá rapaz, continuemos com as vendas; ela é isso mesmo, mas é a esposa do chefe e não minha, portanto tem total razão! - Estava pensando em levar anti-inflamatórios e ataduras depois desta bola fora meu amigo, com medo do estrago que faria na minha cara, assim você me mata do coração; mas então já que não morri, por favor me veja aquele envelope de camisinhas. - sorri olhando para a mulher do chefe! - sorriso amarelo e brilhante e com um "ufa"...

- Hum, deixe-me ver, o que mais preciso? - pensei falando alto... - Barbeador e umas latas de leite NAN. - Intrometeu-se. - Barbeador sim, mas porque leite NAN? Por acaso estou desnutrido “doutor atendente”? - questionei não entendendo onde queria chegar. - É o que tenho de mais caro aqui que e pode vendido sem receita médica, leve uma caixa fechada e faça um vendedor feliz! - Hehe! - Vá ganhar às custas de aposentados, meu caro - sorri!

- Vamos lá cara, traga-me a atendente, digo complexo “B”, quero tirar a embalagem e ver a bula para saber quantos miligramas tem realmente. - Só trago se for realmente comprar! - disse com petulância. - Traga logo senão vou ser obrigado a apontar para a mulher do seu chefe e rir, acho que ela não vai gostar que estamos reparando em detalhes da sua anatomia. - Virei o jogo; sou bom nisso! - Aqui está! O que mais precisa “senhor cliente”! - disse aceitando a sua derrota e rangendo os dentes!

Tem gente que não tem medo do perigo mesmo, mas gostei deste cara...é um desperdício de talento, tem bom humor, pensei – mas que está comendo a mulher do chefe, com certeza está, filho da puta!

- Você tá saindo com ela né cara? - chutei o balde, foda-se ele estava feliz com a boa comissão das vendas e ainda a "comição" da patroa. - Garoto esperto, nem precisa de vitamina “B”; tem raciocínio rápido. - concluiu o vendedor.

Fiquei ainda mais uns vinte minutos, comprei remédios para sintomas da gripe, antiácidos, preservativos, anti-inflamatório, pílulas de cafeína concentrada, esparadrapo, gaze, paracetamol (meu coringa) água oxigenada, band-aid e um monte de coisa que mal lembro o nome ....Peguei minha cestinha pela boca com remédios e afins , feliz da vida por achar tudo o que eu dia vou precisar (ou não) fui para o caixa segurando o riso.

Olhei para o vendedor e ele disse em tom irônico: - Tome a “vitamina” sempre ingerindo algum liquido, geralmente antes de ir dormir, caso não resolva seu problema, procure outra “vitamina”; há inúmeras no mercado, esperando para serem testadas. Tenha uma boa noite senhor e se precisar, procure-nos, estamos aqui para servi-lo! - concluiu formalmente - irônico e satisfeito com a vultuosa venda.

- Débito ou crédito moço? - perguntou sorridente a vitamina, digo a caixa, dona da farmácia. -
-Débito senhora, débito, por favor. - disse eu, serio e formal.

- Pode colocar o cartão, mas com força porque a máquina está com problema querido. - disse serelepe e inclinando-se para mim. - Foi combinado isso né - pensei! Olhei novamente para o vendedor e ele discretamente sorria e espanava o balcão como se nada tivesse acontecendo.

Peguei meu comprovante fui embora. Entrando no carro me lembrei....- Esqueci a dipirona em gotas, mas que droga!

(Diálogo real, sem nenhuma adaptação - aconteceu às 22:49, do dia 04/06/2009, em Foz do Iguaçu, avenida Silvio Américo Sasdelli; Só não me perguntem o nome da farmácia, por favor).

2 comentários:

  1. Isso me lembrou quando fui numa pastelaria com um amigo e ele pediu um pão-de-queijo, ao que o pasteleiro sussurou: Véy, de boa, esse pão de queijo tá ruim, escolhe outra coisa.

    AFGFDGHASFDAHGSFDAHSD....

    E "débito com força" eu achei legal. Hehehe.


    oi.

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  2. EXCELENTE!
    A descrição é tão perfeita que consigo visualizar a cena... é como se estivesse defronte a uma crônica do jornal de domingo... (depois me diga se a tentativa de levantar o ego funcionou, rs...)
    Bjos, boa semana!

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